As amidas ocupam um papel central na química orgânica e, especialmente, na química medicinal, sendo fundamentais para a produção de uma ampla variedade de fármacos. Presentes tanto em compostos naturais quanto em substâncias sintéticas, elas estão diretamente relacionadas à eficácia terapêutica de inúmeros medicamentos. Quando observamos a evolução da indústria farmacêutica, percebemos que o grupo funcional amida se repete em diversas moléculas bioativas, o que explica sua relevância para o desenvolvimento de antibióticos, analgésicos, antivirais e medicamentos considerados essenciais pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
De forma simples, uma amida pode ser entendida como um composto químico que contém o grupo funcional –CONH₂ ou suas variações, resultado da reação entre um ácido carboxílico e a amônia ou uma amina. Essa estrutura confere propriedades específicas, como estabilidade química, capacidade de formar ligações de hidrogênio e boa interação com alvos biológicos, características que explicam sua presença frequente em moléculas terapêuticas. Por essa razão, as amidas não são apenas componentes estruturais, mas elementos ativos que influenciam a maneira como um medicamento atua no organismo.
Na química medicinal, as amidas desempenham um papel estratégico porque aumentam a estabilidade metabólica das moléculas e favorecem a ligação com proteínas e enzimas, otimizando a eficácia farmacológica. Isso é visível em diversos medicamentos de grande impacto, desde os antibióticos β-lactâmicos, como penicilinas e cefalosporinas, até fármacos utilizados no combate a doenças crônicas e infecciosas. Em muitos casos, a introdução de um grupo amida na estrutura molecular é o que garante ao medicamento propriedades adequadas de solubilidade, absorção e durabilidade no organismo.
A produção de antibióticos é um dos campos mais expressivos em que as amidas demonstram sua importância. O anel β-lactâmico, por exemplo, presente em penicilinas, é essencial para a ação contra bactérias, impedindo a formação da parede celular microbiana. Sem a presença da função amida, esse mecanismo de ação não seria possível. Além dos antibióticos, as amidas também aparecem em analgésicos como o paracetamol, em antirretrovirais usados no tratamento do HIV e em fármacos oncológicos, tornando-se indispensáveis para a medicina moderna.
Diante desse cenário, o objetivo deste artigo é apresentar, de forma clara e didática, como as amidas participam da síntese de antibióticos e medicamentos essenciais. Vamos explorar desde a definição e propriedades desse grupo funcional até sua aplicação em rotas sintéticas modernas, destacando exemplos práticos e seu impacto na saúde pública.
As amidas são compostos orgânicos de grande relevância na química e na biologia, com destaque especial na área da química medicinal. Elas estão presentes em inúmeros processos biológicos, moléculas naturais e medicamentos que fazem parte do cotidiano clínico e farmacêutico. Para compreender sua importância na síntese de antibióticos e medicamentos essenciais, é preciso começar entendendo sua definição química, sua estrutura molecular, suas propriedades físico-químicas e o papel fundamental que desempenham na reatividade e na interação com biomoléculas.
Do ponto de vista químico, as amidas são compostos derivados de ácidos carboxílicos, nos quais o grupo hidroxila (–OH) é substituído por um grupo amino (–NH₂, –NHR ou –NR₂). Essa transformação resulta em uma ligação característica, conhecida como ligação amida ou ligação peptídica, quando presente em cadeias de aminoácidos.
A fórmula geral de uma amida pode ser representada como:
R–CO–NRR"
R: grupo alquila ou arila ligado ao carbono carbonílico.
NRR": grupo amino que pode variar de acordo com o número de substituintes (hidrogênios ou radicais orgânicos).
Essa diversidade estrutural confere às amidas uma vasta gama de propriedades, tornando-as extremamente versáteis tanto em sistemas biológicos quanto na síntese de compostos artificiais.
As amidas estão presentes em diversas classes de substâncias químicas, desde proteínas (constituídas por ligações peptídicas, que nada mais são do que amidas) até medicamentos sintéticos projetados em laboratórios. Portanto, compreender o que são as amidas é compreender parte da base estrutural da vida e das terapias modernas.
O grupo funcional característico das amidas é o carbonila (C=O) ligado a um nitrogênio (–N). Essa combinação resulta em três principais tipos de amidas, dependendo da substituição feita no átomo de nitrogênio:
Amidas primárias (R–CONH₂)
O nitrogênio está ligado a dois átomos de hidrogênio.
Exemplo: formamida (HCONH₂).
Amidas secundárias (R–CONHR)
O nitrogênio está ligado a um hidrogênio e a um grupo orgânico.
Exemplo: N-metilformamida (HCONHCH₃).
Amidas terciárias (R–CONRR")
O nitrogênio está ligado a dois grupos orgânicos.
Exemplo: N,N-dimetilformamida (DMF, HCON(CH₃)₂).
Essa diversidade estrutural influencia diretamente as propriedades físico-químicas e a reatividade das amidas, tornando-as altamente ajustáveis para diferentes finalidades.
Outro ponto importante na estrutura das amidas é a ressonância eletrônica: a ligação entre o carbono carbonílico e o nitrogênio apresenta caráter de dupla ligação parcial, o que confere maior estabilidade e reduz a reatividade em relação a outros derivados de ácidos carboxílicos, como ésteres e cloretos de ácido. Essa característica é essencial para a estabilidade das proteínas e também para a durabilidade de medicamentos dentro do organismo.
As amidas apresentam propriedades físico-químicas únicas, que explicam sua ampla utilização em medicamentos e moléculas bioativas. Entre as principais características, destacam-se:
As amidas possuem forte caráter polar devido à presença do grupo carbonila (C=O) e ao nitrogênio. Essa polaridade permite a formação de ligações de hidrogênio com moléculas de água e com biomoléculas, aumentando a solubilidade e a capacidade de interação em meio biológico.
Amidas primárias e secundárias: formam ligações de hidrogênio mais intensas, devido à presença de hidrogênios ligados ao nitrogênio.
Amidas terciárias: não possuem hidrogênio diretamente ligado ao nitrogênio, mas ainda podem atuar como aceitadores de ligações de hidrogênio.
Comparadas a outros derivados de ácidos carboxílicos, as amidas apresentam altos pontos de fusão e ebulição devido às ligações de hidrogênio intermoleculares. Essa característica é importante para a estabilidade térmica dos medicamentos que contêm amidas.
A ressonância da ligação amida confere resistência a hidrólises espontâneas, tornando-as mais estáveis em comparação a ésteres, por exemplo. Essa estabilidade é essencial para a função biológica das proteínas e para a durabilidade de fármacos em circulação no organismo.
Amidas de baixo peso molecular são geralmente solúveis em água, característica que favorece a absorção e biodisponibilidade de fármacos. Já as amidas maiores podem apresentar solubilidade reduzida, mas mantêm alta afinidade por biomoléculas.
O nitrogênio da amida é menos básico do que em aminas livres, devido ao efeito da ressonância. Essa modulação da basicidade é relevante para o comportamento farmacológico das moléculas em diferentes pHs do corpo.
Essas propriedades explicam por que a função amida é tão recorrente no design de medicamentos: ela combina estabilidade, versatilidade de interações e solubilidade adequada, elementos indispensáveis para moléculas ativas.
Além das propriedades físico-químicas, as amidas desempenham funções cruciais em reações químicas e na interação com biomoléculas, fatores que explicam sua importância na biologia e na farmacologia.
Apesar de relativamente estáveis, as amidas podem participar de reações importantes:
Hidrólise: sob condições ácidas ou básicas, podem ser convertidas novamente em ácidos carboxílicos e aminas.
Acoplamento peptídico: reação fundamental para a formação de proteínas e para a síntese de antibióticos e outros peptídeos bioativos.
Reações de substituição: em condições específicas, podem dar origem a novos derivados funcionais, úteis no desenvolvimento de fármacos.
Essa reatividade controlada é aproveitada em laboratório para a criação de novos medicamentos e também é essencial nos processos biológicos naturais.
As amidas são parte fundamental das proteínas, graças à ligação peptídica, que conecta aminoácidos em longas cadeias. Essa ligação apresenta estabilidade, mas também flexibilidade suficiente para permitir a conformação tridimensional das proteínas, determinando sua função biológica.
Além disso, as amidas presentes em medicamentos permitem:
Interação com enzimas: muitas enzimas reconhecem substratos pela presença de amidas, facilitando a ligação e a ação catalítica.
Reconhecimento molecular: em antibióticos, as amidas podem se ligar a proteínas bacterianas, inibindo processos vitais.
Ajuste farmacocinético: a presença de amidas em fármacos pode melhorar sua absorção, distribuição e permanência no organismo.
A ligação amida é responsável pela estrutura primária das proteínas, garantindo sua integridade funcional. Em antibióticos e outros medicamentos, essa ligação é explorada para criar moléculas que imitam ou bloqueiam componentes essenciais das células, interferindo em processos patológicos.
O conhecimento da definição, estrutura e propriedades das amidas é a base para compreender por que elas são tão utilizadas na síntese de antibióticos e outros medicamentos essenciais. A versatilidade química das amidas, somada à sua capacidade de interação biológica, torna esse grupo funcional uma das ferramentas mais poderosas no design de novos fármacos.
Antibióticos como penicilinas e cefalosporinas, analgésicos como o paracetamol e antivirais como a zidovudina só apresentam sua eficácia graças à presença de amidas em suas estruturas. Essa função química não apenas contribui para a atividade farmacológica, mas também para a estabilidade, a biodisponibilidade e a eficiência terapêutica dos medicamentos.
As amidas ocupam um lugar de destaque na química medicinal, ramo da ciência que estuda a relação entre a estrutura molecular e a atividade biológica de compostos usados como medicamentos. Esse grupo funcional simples à primeira vista — formado pela ligação entre um carbono carbonílico e um nitrogênio — apresenta propriedades únicas que explicam sua recorrência em antibióticos, analgésicos, antivirais, anticâncer e em uma ampla gama de moléculas bioativas.
A relevância das amidas não está apenas na sua estabilidade química e biológica, mas também na sua capacidade de estabelecer interações específicas com receptores biológicos e na sua presença em inúmeras moléculas bioativas naturais e sintéticas. Compreender a importância desse grupo funcional é essencial para entender o desenvolvimento de medicamentos e a busca por novas soluções terapêuticas.
Um dos fatores que tornam as amidas tão importantes na química medicinal é a sua estabilidade. Diferente de outros derivados de ácidos carboxílicos, como ésteres ou anidridos, as amidas apresentam uma ligação característica resultante da ressonância eletrônica entre o nitrogênio e o grupo carbonila.
Essa ressonância dá à ligação amida um caráter de dupla ligação parcial, tornando-a menos suscetível a hidrólises espontâneas. Isso significa que as amidas são mais resistentes à quebra em condições fisiológicas normais, o que é essencial para medicamentos que precisam manter sua integridade estrutural durante a absorção, circulação e distribuição no organismo.
Comparação com ésteres: enquanto um éster pode ser rapidamente hidrolisado por enzimas esterases, uma amida apresenta muito maior resistência, prolongando sua ação terapêutica.
Proteção contra degradação química: muitos fármacos utilizam a função amida como forma de garantir durabilidade e estabilidade durante a produção, armazenamento e administração.
No organismo, a estabilidade das amidas também está ligada ao controle do metabolismo de medicamentos. Embora existam enzimas conhecidas como amidases que promovem a hidrólise dessas ligações, o processo é mais lento em comparação com outros grupos funcionais, garantindo que o fármaco mantenha sua atividade por mais tempo.
Essa característica é particularmente útil em antibióticos, como as penicilinas e cefalosporinas, que dependem da função amida para resistir à degradação inicial e alcançar os alvos bacterianos de forma eficaz.
A estabilidade química e biológica das amidas influencia diretamente parâmetros como:
Meia-vida plasmática: fármacos contendo amidas tendem a permanecer mais tempo na circulação.
Biodisponibilidade: a função amida protege o medicamento até que ele alcance o local de ação.
Perfil de liberação: permite o desenvolvimento de formulações de ação prolongada.
Portanto, a função amida não é apenas um detalhe estrutural, mas um componente fundamental que garante a eficiência terapêutica de inúmeros medicamentos.
Além da estabilidade, outro fator determinante para a importância das amidas na química medicinal é sua capacidade de interagir com receptores biológicos, como enzimas, proteínas transportadoras e receptores de membrana. Essas interações ocorrem principalmente devido às propriedades eletrônicas e à capacidade de formar ligações de hidrogênio, além de influenciarem solubilidade e permeabilidade celular.
As amidas podem atuar tanto como doadores quanto como aceitadores de ligações de hidrogênio, devido à presença do grupo carbonila e do átomo de nitrogênio. Isso possibilita interações fortes e direcionadas com resíduos de aminoácidos presentes em proteínas, garantindo afinidade com o receptor.
Exemplo em antibióticos: no caso dos β-lactâmicos, a ligação amida é essencial para interagir com as enzimas responsáveis pela síntese da parede celular bacteriana, bloqueando sua atividade.
Exemplo em antivirais: amidas presentes em análogos de nucleosídeos ajudam a mimetizar as bases nitrogenadas e se incorporar ao DNA ou RNA viral, interrompendo a replicação.
A polaridade das amidas favorece a solubilidade em água, característica essencial para medicamentos que precisam circular no plasma sanguíneo. Ao mesmo tempo, sua estrutura pode ser modificada para aumentar a lipofilicidade, facilitando a penetração em membranas celulares.
Esse equilíbrio entre hidrossolubilidade e lipossolubilidade é fundamental para determinar o perfil farmacocinético de um medicamento. A introdução ou modificação de grupos amídicos é, portanto, uma estratégia comum no design de fármacos para ajustar suas propriedades de absorção e distribuição.
Muitos medicamentos precisam atravessar membranas biológicas para alcançar seu alvo intracelular. A presença da função amida, em conjunto com outras características estruturais, pode favorecer essa permeabilidade.
Exemplo em fármacos anticâncer: a capecitabina, um pró-fármaco utilizado no tratamento de tumores, contém grupos amídicos que ajudam na penetração celular e posterior ativação em sua forma ativa.
Exemplo em analgésicos: o paracetamol, com seu grupo amida ligado a um anel aromático, combina boa solubilidade e permeabilidade, o que explica sua rápida ação.
Portanto, as amidas atuam como pontes químicas entre a molécula e seu alvo biológico, garantindo tanto a interação adequada quanto a viabilidade farmacocinética.
A presença das amidas em moléculas bioativas é vasta, abrangendo desde compostos naturais, como proteínas e peptídeos, até fármacos sintéticos desenvolvidos em laboratório. Essa versatilidade é um dos principais motivos pelos quais a função amida é tão explorada na química medicinal.
Na natureza, a ligação amida é onipresente, especialmente em proteínas e peptídeos. A ligação peptídica, que conecta aminoácidos, nada mais é do que uma amida.
Proteínas: toda proteína, seja estrutural, enzimática ou reguladora, depende da estabilidade das ligações amídicas para manter sua estrutura primária.
Peptídeos bioativos: hormônios como a insulina e antibióticos naturais como a bacitracina contêm amidas essenciais para sua atividade.
Alcaloides e metabólitos secundários: muitos compostos naturais utilizados como medicamentos apresentam grupos amida em sua estrutura, contribuindo para sua afinidade biológica.
Na síntese de fármacos, as amidas aparecem de forma recorrente em diferentes classes terapêuticas:
Antibióticos β-lactâmicos (penicilinas, cefalosporinas, carbapenêmicos): possuem um anel β-lactâmico, que é uma amida cíclica crucial para sua atividade bactericida.
Analgésicos (paracetamol): a função amida garante estabilidade e ação eficaz no controle da dor e da febre.
Anticâncer (capecitabina, paclitaxel): a presença de amidas melhora a biodisponibilidade e contribui para a seletividade tumoral.
Antirretrovirais (tenofovir, zidovudina): amidas estabilizam a molécula e facilitam sua ação contra o HIV.
As amidas também são usadas em estratégias de pró-fármacos, em que a molécula é administrada em uma forma inativa e convertida no organismo em sua forma ativa. Esse recurso é útil para melhorar solubilidade, absorção ou reduzir efeitos colaterais.
A adição de grupos amida pode modular propriedades farmacológicas, ajustando a liberação do princípio ativo no corpo.
Isso reforça a função das amidas como ferramentas de engenharia molecular no desenvolvimento de medicamentos mais eficazes.
A presença recorrente das amidas em moléculas bioativas não é fruto do acaso, mas do conjunto de vantagens que esse grupo funcional oferece:
Estabilidade estrutural, garantindo que o fármaco não se degrade facilmente.
Interações específicas com receptores, por meio de ligações de hidrogênio e efeitos eletrônicos.
Ajuste de propriedades farmacocinéticas, como solubilidade e permeabilidade.
Flexibilidade sintética, permitindo a introdução de amidas em diferentes contextos moleculares.
Relevância biológica, uma vez que imitam ligações naturais presentes em proteínas e peptídeos.
Essas vantagens fazem das amidas um dos grupos funcionais mais utilizados e estudados na química medicinal, especialmente no desenvolvimento de antibióticos e medicamentos considerados essenciais para a saúde pública.
A descoberta e o desenvolvimento de antibióticos revolucionaram a medicina moderna, permitindo controlar infecções que antes eram fatais. Entre os diferentes grupos funcionais presentes nas moléculas de antibióticos, as amidas ocupam posição central, pois estão diretamente ligadas à atividade antibacteriana e à estabilidade química dessas substâncias. Desde os primeiros antibióticos descobertos até os mais modernos, a presença de estruturas amídicas tem se mostrado indispensável para a eficácia terapêutica.
O marco inicial do uso de antibióticos ocorreu com a descoberta da penicilina por Alexander Fleming em 1928. Essa molécula contém em sua estrutura o famoso anel β-lactâmico, que nada mais é do que uma amida cíclica altamente reativa. Essa característica estrutural foi responsável pela capacidade da penicilina de inibir enzimas fundamentais para a formação da parede celular bacteriana, levando à morte dos microrganismos.
Na década de 1940, a penicilina foi produzida em larga escala, tornando-se o primeiro antibiótico utilizado amplamente no tratamento de infecções bacterianas. O sucesso dessa descoberta estimulou a busca por outros compostos com estruturas semelhantes, dando origem a novas classes de antibióticos, muitos deles também baseados em funções amídicas.
Posteriormente, foram identificadas outras classes de antibióticos naturais, como os glicopeptídeos (exemplo: vancomicina), que possuem várias ligações amídicas em suas cadeias peptídicas. Esses compostos mostraram grande eficácia contra bactérias resistentes, consolidando ainda mais a importância das amidas na farmacologia antimicrobiana.
Os antibióticos β-lactâmicos são os mais conhecidos e amplamente utilizados, incluindo penicilinas, cefalosporinas, carbapenêmicos e monobactâmicos. O ponto comum entre eles é a presença do anel β-lactâmico, uma amida cíclica de quatro membros.
Penicilinas: caracterizadas pelo anel β-lactâmico fundido a um anel tiazolidínico. São eficazes contra uma ampla gama de bactérias e foram os primeiros antibióticos a serem produzidos em escala industrial.
Cefalosporinas: possuem estrutura semelhante às penicilinas, mas com um anel di-hidrotiazínico em vez do tiazolidínico, o que lhes confere maior resistência a enzimas bacterianas como as β-lactamases.
Carbapenêmicos: antibióticos de amplo espectro que também contêm o anel β-lactâmico, mas com modificações estruturais que aumentam a estabilidade contra resistência bacteriana.
Monobactâmicos: apresentam apenas o anel β-lactâmico sem fusão a outros anéis, sendo eficazes contra bactérias Gram-negativas.
A presença da amida nesse anel é fundamental, pois ela imita a ligação peptídica natural das bactérias. Dessa forma, o antibiótico consegue enganar as enzimas bacterianas chamadas transpeptidases, responsáveis por formar a parede celular, bloqueando sua ação.
A vancomicina é um antibiótico glicopeptídico usado principalmente contra bactérias Gram-positivas resistentes, como o Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA).
Sua estrutura é complexa e contém diversas ligações amídicas que conectam aminoácidos aromáticos modificados. Essas ligações conferem estabilidade e permitem a formação de múltiplas interações com os precursores da parede celular bacteriana.
O mecanismo de ação da vancomicina baseia-se na capacidade de suas amidas participarem de ligações de hidrogênio com o terminal D-Ala-D-Ala dos peptidoglicanos bacterianos, impedindo a polimerização e o entrecruzamento da parede celular. Sem essa estrutura de amida, a vancomicina não teria a mesma afinidade com o alvo biológico.
A daptomicina é um antibiótico lipopeptídico utilizado contra bactérias Gram-positivas resistentes. Sua estrutura consiste em um ciclo peptídico contendo várias ligações amídicas, ligadas a uma cauda lipofílica.
Essas amidas são responsáveis por conferir estabilidade à estrutura do peptídeo, permitindo que a molécula interaja de forma seletiva com membranas bacterianas. O mecanismo de ação envolve a inserção da porção lipídica na membrana celular, seguida pela oligomerização e formação de poros, resultando na morte da célula bacteriana.
Sem as ligações amídicas que compõem seu núcleo peptídico, a daptomicina não teria a conformação necessária para interagir com a membrana bacteriana de forma tão eficiente.
A função amida desempenha papéis cruciais na atividade antibacteriana, atuando de diferentes formas de acordo com a classe de antibiótico:
Imitação da ligação peptídica
Nos antibióticos β-lactâmicos, a amida cíclica imita a ligação peptídica natural da parede celular bacteriana. Isso faz com que as enzimas transpeptidases confundam o antibiótico com seu substrato natural, bloqueando sua atividade.
Estabilidade estrutural
Nos glicopeptídeos e lipopeptídeos, as amidas garantem que a estrutura peptídica mantenha a conformação adequada para interagir com alvos biológicos.
Formação de ligações de hidrogênio
As amidas podem atuar como doadoras e aceitadoras de ligações de hidrogênio, permitindo interações específicas com precursores da parede celular bacteriana.
Propriedades físico-químicas
A presença de amidas aumenta a solubilidade, a biodisponibilidade e a afinidade com os alvos bacterianos, além de prolongar a meia-vida dos medicamentos.
Portanto, a função amida não é apenas um detalhe estrutural, mas um elemento essencial para a eficácia antibacteriana de diversos grupos de antibióticos.
A síntese de antibióticos contendo amidas evoluiu ao longo das décadas, passando de métodos tradicionais para rotas modernas mais eficientes e sustentáveis.
Fermentação microbiana: muitos antibióticos naturais, como penicilinas e cefalosporinas, foram originalmente produzidos por microrganismos em processos de fermentação. As amidas faziam parte da estrutura natural sintetizada por enzimas bacterianas.
Modificação química: a partir dos antibióticos naturais, químicos modificavam grupos funcionais para melhorar a estabilidade, o espectro de ação ou a resistência a enzimas bacterianas.
Com o avanço da química sintética e da biotecnologia, novas estratégias foram desenvolvidas para produzir antibióticos amídicos:
Síntese total em laboratório: permite construir antibióticos complexos a partir de blocos moleculares simples, garantindo maior controle sobre as modificações estruturais.
Química combinatória: utilizada para gerar bibliotecas de compostos com diferentes variações na função amida, acelerando a busca por novos antibióticos.
Biocatálise enzimática: uso de enzimas específicas para promover a formação de ligações amida de maneira seletiva e em condições brandas, alinhando-se aos princípios da química verde.
Engenharia genética e biossíntese: microrganismos geneticamente modificados são capazes de produzir antibióticos com novas funções amídicas, aumentando o potencial terapêutico.
Atualmente, há grande interesse em desenvolver rotas sintéticas que sejam mais ecológicas e eficientes, reduzindo o uso de solventes tóxicos e energia. As reações de acoplamento amídico catalisadas por metais e a aplicação de síntese em fluxo contínuo são exemplos de tecnologias modernas que estão sendo aplicadas na produção de antibióticos.
As amidas ocupam um lugar de destaque não apenas na síntese de antibióticos, mas também em uma ampla gama de medicamentos que compõem a Lista de Medicamentos Essenciais da Organização Mundial da Saúde (OMS). Essa lista reúne os fármacos considerados indispensáveis para atender às necessidades básicas de saúde de uma população, garantindo eficácia, segurança e custo-benefício. Ao analisar os princípios ativos presentes nessa relação, fica evidente que o grupo funcional amida aparece de forma recorrente, reforçando sua importância para a medicina global.
As amidas contribuem para a estabilidade química, para as interações específicas com alvos biológicos e para a eficácia terapêutica de diferentes classes de medicamentos. Embora os antibióticos sejam os exemplos mais conhecidos, esse grupo funcional também está presente em analgésicos, anticâncer, antivirais e diversos outros medicamentos de uso cotidiano.
A Lista de Medicamentos Essenciais (LME) da OMS foi criada em 1977 com o objetivo de orientar países na formulação de políticas de saúde e na aquisição de medicamentos prioritários. Atualizada a cada dois anos, ela reúne os fármacos que devem estar sempre disponíveis em sistemas de saúde, considerando critérios como:
Relevância clínica: são medicamentos indicados para tratar doenças de alta prevalência ou impacto social.
Eficácia e segurança: possuem eficácia comprovada e perfis de segurança adequados.
Custo-benefício: devem ser acessíveis para a maioria das populações.
Atualmente, a lista inclui cerca de 500 medicamentos para adultos e crianças, abrangendo diferentes áreas terapêuticas. Nela, encontramos diversos compostos que possuem em sua estrutura o grupo funcional amida, evidenciando a importância química e farmacológica dessa função.
Embora os antibióticos sejam o exemplo mais marcante do uso de amidas, a Lista de Medicamentos Essenciais também inclui outros grupos terapêuticos em que essas funções desempenham papéis fundamentais. Entre eles estão os analgésicos, os anticâncer e os antirretrovirais.
O paracetamol (acetaminofeno) é um dos medicamentos mais utilizados no mundo para o alívio da dor e da febre. Presente na Lista da OMS, ele é um exemplo clássico de analgésico com uma função amida em sua estrutura.
Estrutura química: o paracetamol contém um grupo amida ligado a um anel aromático.
Papel da amida: essa função confere estabilidade à molécula e participa de interações com enzimas no sistema nervoso central.
Mecanismo de ação: o paracetamol inibe seletivamente a enzima ciclo-oxigenase (COX) no cérebro, reduzindo a síntese de prostaglandinas responsáveis pela dor e febre.
Sua ampla utilização se deve à eficácia, segurança em doses adequadas e custo acessível. Sem a presença da amida, a molécula não teria as mesmas propriedades farmacológicas e estabilidade necessárias para ser um dos analgésicos mais importantes globalmente.
A capecitabina é um medicamento utilizado no tratamento de diversos tipos de câncer, incluindo o câncer colorretal e o câncer de mama. Classificada como pró-fármaco, ela é convertida no organismo em 5-fluorouracil (5-FU), uma substância ativa que inibe a síntese de DNA em células tumorais.
Estrutura química: a capecitabina possui grupos amida que estabilizam sua estrutura e auxiliam no processo de ativação no organismo.
Função da amida: garante que o fármaco seja absorvido de forma eficaz e convertido seletivamente em tecidos tumorais.
Importância clínica: por ser um pró-fármaco, causa menos efeitos colaterais do que a administração direta de 5-FU, pois a conversão em sua forma ativa ocorre preferencialmente nas células cancerígenas.
A presença da amida nesse medicamento é crucial para permitir sua estabilidade, seletividade e eficácia, tornando-o um dos agentes quimioterápicos incluídos na lista da OMS.
O tratamento da infecção por HIV revolucionou-se com o surgimento dos antirretrovirais, muitos deles contendo amidas em sua estrutura. Dois exemplos clássicos são o tenofovir e a zidovudina, ambos presentes na Lista de Medicamentos Essenciais da OMS.
Estrutura química: contém um grupo amida que contribui para a estabilidade do análogo de nucleotídeo.
Mecanismo de ação: atua como inibidor da transcriptase reversa, impedindo a replicação do HIV.
Função da amida: garante maior solubilidade e estabilidade da molécula no meio biológico, permitindo sua eficácia no bloqueio da replicação viral.
Estrutura química: apresenta uma amida ligada à sua cadeia de nucleosídeo.
Mecanismo de ação: também inibe a transcriptase reversa do HIV, sendo um dos primeiros medicamentos aprovados para o tratamento da AIDS.
Importância clínica: graças à sua estrutura amídica, a zidovudina mantém boa estabilidade e consegue se incorporar ao DNA viral, interrompendo sua replicação.
A presença de amidas em antivirais é fundamental, pois aumenta a durabilidade do fármaco no organismo e garante interações eficazes com enzimas virais, assegurando o sucesso terapêutico.
Abaixo estão alguns exemplos de medicamentos presentes na Lista de Medicamentos Essenciais da OMS que possuem funções amídicas em sua estrutura:
Classe Terapêutica | Medicamento | Função da Amida | Impacto na Terapia |
---|---|---|---|
Analgésico | Paracetamol | Estabilidade e interação com COX | Controle eficaz da dor e febre |
Anticâncer | Capecitabina | Estabilidade e ativação seletiva | Tratamento de tumores sólidos com menor toxicidade |
Antirretroviral | Tenofovir | Solubilidade e estabilidade | Bloqueio da replicação do HIV |
Antirretroviral | Zidovudina | Estabilidade e incorporação ao DNA viral | Tratamento eficaz contra HIV/AIDS |
Antibiótico | Ceftriaxona (β-lactâmico) | Anel β-lactâmico (amida cíclica) | Inibição da síntese da parede celular bacteriana |
As amidas são um dos grupos funcionais mais importantes da química orgânica e da química medicinal, desempenhando papéis centrais em moléculas bioativas, antibióticos, analgésicos, antivirais e anticâncer. A relevância desse grupo funcional faz com que a síntese de amidas seja um dos campos mais estudados na química sintética.
Ao longo da história, diferentes rotas foram desenvolvidas, desde as clássicas, baseadas em reações tradicionais da química orgânica, até as mais modernas e sustentáveis, que se alinham aos princípios da química verde e às necessidades da indústria farmacêutica contemporânea. Compreender essas metodologias é essencial para entender como novos medicamentos são criados e como a produção farmacêutica pode ser otimizada.
As rotas clássicas de síntese de amidas estão entre as mais estudadas e ainda hoje são amplamente aplicadas. Elas envolvem reações simples que, quando bem controladas, fornecem bons rendimentos.
A hidrólise de nitrilas é um dos métodos mais tradicionais de obtenção de amidas. Nesse processo, um grupo nitrila (–CN) é convertido em amida por reação com água, em condições ácidas ou básicas.
Reação em meio ácido: a nitrila é protonada, facilitando o ataque nucleofílico da água, formando um intermediário que se rearranja para dar origem à amida.
Reação em meio básico: a base ativa a água ou hidróxido para atacar o carbono da nitrila, gerando a amida após etapas de rearranjo.
Exemplo prático: esse método é frequentemente utilizado na produção de intermediários farmacêuticos, onde nitrilas baratas são convertidas em amidas que servem de blocos construtores para moléculas maiores.
Outra forma clássica é a reação de cloretos de ácido com amônia ou aminas.
Cloreto de ácido + amônia → amida primária
Cloreto de ácido + amina primária → amida secundária
Cloreto de ácido + amina secundária → amida terciária
Esse método é altamente eficiente porque o cloreto de ácido é um derivado altamente reativo. A reação ocorre rapidamente, geralmente em boas condições de rendimento.
Desvantagem: a produção de cloretos de ácido pode gerar subprodutos corrosivos como HCl, exigindo cuidados adicionais.
Apesar disso, esse processo ainda é uma das rotas mais utilizadas em laboratórios e indústrias para a síntese de amidas.
Com os avanços da química sintética e a crescente preocupação ambiental, novas metodologias foram desenvolvidas para tornar a síntese de amidas mais eficiente e menos poluente. Essas abordagens se enquadram nos princípios da química verde, buscando reduzir o uso de solventes tóxicos, aumentar a seletividade e minimizar resíduos.
A catálise enzimática é uma alternativa moderna e sustentável para a formação de amidas. Enzimas como lipases e amidases podem ser usadas para promover a reação entre ácidos carboxílicos e aminas em condições brandas.
Vantagens:
Alta seletividade.
Reações em condições suaves de temperatura e pressão.
Redução do uso de reagentes agressivos.
Aplicações na indústria farmacêutica:
Síntese de intermediários quirais para medicamentos.
Produção de peptídeos bioativos.
Desenvolvimento de antibióticos derivados de cadeias peptídicas.
Um exemplo relevante é a aplicação de lipases na síntese de amidas em condições aquosas ou livres de solventes orgânicos, reduzindo significativamente o impacto ambiental.
A busca por rotas sintéticas mais ecológicas levou ao desenvolvimento de metodologias que eliminam ou reduzem solventes tóxicos e condições agressivas.
Reações em água: a água, por ser um solvente não tóxico e abundante, tem sido usada em sínteses de amidas, aproveitando sua capacidade de estabilizar intermediários.
Síntese em fase sólida: muito utilizada na química de peptídeos, reduz a necessidade de grandes volumes de solventes.
Uso de solventes alternativos: solventes iônicos e líquidos eutéticos profundos têm sido explorados para substituir solventes orgânicos nocivos.
Essas estratégias estão diretamente ligadas às práticas de sustentabilidade industrial, permitindo que a produção de medicamentos seja menos poluente e mais eficiente.
Um dos métodos mais importantes na síntese moderna de amidas é o acoplamento peptídico, amplamente utilizado na produção de antibióticos e medicamentos peptídicos.
Esse método consiste em unir um grupo carboxílico de um aminoácido ao grupo amino de outro, formando uma ligação peptídica (amida).
Agentes de acoplamento:
Carbodiimidas (DCC, EDC).
Reagentes como HATU, HOBt e outros aditivos.
Aplicações práticas:
Síntese de antibióticos como a vancomicina, que contém múltiplas ligações amida em sua estrutura.
Produção de hormônios peptídicos e antivirais.
Desenvolvimento de fármacos experimentais baseados em peptídeos sintéticos.
Esse método é fundamental porque permite a construção de moléculas complexas com precisão, garantindo a correta sequência de aminoácidos e, consequentemente, a atividade biológica desejada.
A indústria farmacêutica depende fortemente das rotas de síntese de amidas, pois elas estão presentes em grande parte dos medicamentos modernos. A escolha da rota sintética impacta diretamente:
Custo de produção
Rotas mais simples e eficientes reduzem os custos de fabricação, tornando medicamentos mais acessíveis.
Escalabilidade
Métodos robustos são essenciais para a produção em larga escala, mantendo rendimento e qualidade.
Sustentabilidade ambiental
A adoção de sínteses verdes e catalisadas por enzimas atende às crescentes exigências de redução de impacto ambiental.
Inovação em novos medicamentos
O desenvolvimento de novas rotas abre possibilidades para criar moléculas inéditas, essenciais no combate à resistência bacteriana e ao câncer.
Qualidade e segurança
Rotas sintéticas bem definidas garantem a produção de medicamentos com alto grau de pureza e eficácia.
A resistência antimicrobiana é considerada um dos maiores desafios da saúde pública mundial. A Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta que, se não forem encontradas novas soluções, até 2050 milhões de vidas poderão ser perdidas por infecções resistentes. Dentro desse cenário, as amidas — grupos funcionais centrais em inúmeros antibióticos — desempenham papel fundamental na luta contra microrganismos resistentes.
A química medicinal tem se concentrado em modificações estruturais em grupos amídicos, explorando sua flexibilidade e capacidade de interação com biomoléculas para aumentar a eficácia de antibióticos. Além disso, estudos de relação estrutura–atividade (SAR) mostram que ajustes sutis na função amida podem alterar drasticamente a capacidade de um fármaco superar mecanismos de resistência.
As amidas são componentes versáteis em moléculas bioativas. Sua presença em antibióticos como penicilinas, cefalosporinas, glicopeptídeos e lipopeptídeos não é coincidência: trata-se de uma característica estratégica para garantir eficácia terapêutica.
Quando bactérias desenvolvem resistência, os químicos medicinais buscam modificar os grupos amídicos das moléculas existentes para recuperar ou potencializar sua atividade.
A introdução de substituintes no nitrogênio ou no carbono da amida pode aumentar a solubilidade do antibiótico, melhorando sua biodisponibilidade. Isso é essencial para garantir que a molécula alcance concentrações adequadas no local da infecção.
Exemplo: em cefalosporinas de nova geração, modificações em grupos amídicos laterais aumentaram a penetração em bactérias Gram-negativas.
Muitas bactérias produzem enzimas chamadas β-lactamases, que degradam antibióticos β-lactâmicos. Alterações na amida do anel β-lactâmico ou em cadeias laterais próximas podem reduzir a afinidade dessas enzimas, tornando o fármaco mais estável.
Exemplo: carbapenêmicos como o imipeném foram desenvolvidos com modificações em amidas que dificultam a ação das β-lactamases.
As amidas são capazes de formar ligações de hidrogênio com proteínas bacterianas. Alterações em sua estrutura podem intensificar essas interações, aumentando a afinidade com as enzimas alvo.
Exemplo: antibióticos glicopeptídicos, como a vancomicina, tiveram cadeias amídicas modificadas para aumentar a força de ligação com precursores da parede celular.
Algumas modificações em amidas ajudam a diminuir efeitos adversos. Ajustando propriedades de lipofilicidade e estabilidade metabólica, os pesquisadores conseguem criar moléculas mais seguras para o organismo humano.
A relação estrutura–atividade (SAR, do inglês Structure–Activity Relationship) é um dos pilares da química medicinal. Esse conceito refere-se ao estudo de como alterações na estrutura química de uma molécula afetam sua atividade biológica.
No caso das amidas, ajustes sutis podem ser decisivos para que um antibiótico supere os mecanismos de resistência bacteriana.
Mudar grupos ligados ao nitrogênio da amida pode:
Tornar a molécula menos reconhecida por enzimas bacterianas.
Alterar a permeabilidade pela membrana celular da bactéria.
Favorecer o alcance do antibiótico a novos sítios de ação.
Exemplo: cefalosporinas de quarta geração apresentam cadeias laterais amídicas específicas que conferem resistência contra β-lactamases.
A ressonância do grupo amida pode ser manipulada por substituintes, modificando a geometria e flexibilidade da molécula. Isso afeta a forma como o antibiótico se encaixa em enzimas bacterianas, permitindo superar mutações no alvo.
A criação de amidas em anéis aumenta a rigidez estrutural, evitando que o antibiótico perca atividade diante de mutações bacterianas. Esse é o caso dos anéis β-lactâmicos, que imitam ligações peptídicas naturais e enganam as transpeptidases bacterianas.
Além da atividade direta, ajustes na função amida podem melhorar:
Absorção oral: tornando o fármaco mais biodisponível.
Distribuição: aumentando sua presença em tecidos-alvo.
Metabolismo: retardando a degradação por enzimas humanas.
Excreção: prolongando a meia-vida plasmática.
Esses fatores farmacocinéticos são cruciais para que o antibiótico não apenas seja ativo, mas também eficaz em condições clínicas reais.
Com a resistência antimicrobiana crescendo em escala global, a pesquisa em novos antibióticos precisa considerar o papel das amidas como centro de inovação. Diversas estratégias modernas vêm sendo aplicadas para explorar esse grupo funcional no desenvolvimento de fármacos.
Muitos antibióticos tradicionais estão sendo redesenhados por meio de modificações em suas amidas. Essa estratégia, chamada de química de aperfeiçoamento, busca melhorar moléculas já conhecidas em vez de criar novas do zero.
Exemplo: cefalosporinas de quinta geração, como a ceftarolina, foram desenvolvidas para superar resistência ao MRSA, graças a ajustes em grupos amídicos.
Pesquisadores têm desenvolvido moléculas híbridas que combinam duas ou mais funções bioativas em uma mesma estrutura amídica. Essa abordagem aumenta a chance de sucesso contra múltiplos mecanismos de resistência bacteriana.
Exemplo: antibióticos híbridos que unem uma porção β-lactâmica com cadeias amídicas modificadas para maior estabilidade.
A síntese de amidas que não ocorrem naturalmente abre espaço para antibióticos inovadores. Ao criar ligações amida artificiais, os cientistas conseguem gerar moléculas que as bactérias nunca encontraram, dificultando o desenvolvimento de resistência.
Exemplo: peptídeos sintéticos com amidas modificadas que resistem à degradação por enzimas bacterianas.
A sustentabilidade também está presente nesse campo. Novos métodos de síntese de amidas utilizam catálise enzimática, reações em água ou processos em fluxo contínuo, reduzindo custos e impactos ambientais, sem perder eficácia.
Essas técnicas permitem que antibióticos amídicos sejam produzidos em larga escala de forma eficiente e ecologicamente correta.
O uso de IA e bioinformática está revolucionando a busca por novos antibióticos. Softwares de modelagem conseguem prever quais modificações em grupos amida aumentariam a eficácia contra determinadas bactérias resistentes.
Essa abordagem reduz custos e acelera o desenvolvimento de novas moléculas.
As amidas são fundamentais na química medicinal, e seu papel vai muito além da presença em antibióticos clássicos, como as penicilinas. Com a evolução tecnológica, a função amida ganhou novos significados e aplicações no futuro da química farmacêutica, especialmente no desenvolvimento de medicamentos personalizados, no avanço da biotecnologia e nas inovações em síntese automatizada.
Essa versatilidade faz das amidas não apenas um grupo funcional clássico, mas um verdadeiro pilar da inovação farmacológica. Para compreender o que vem pela frente, é necessário explorar como novas técnicas de síntese estão transformando sua produção, como a biotecnologia se apropria das amidas em terapias modernas e quais perspectivas se abrem para o desenvolvimento de medicamentos inovadores.
A síntese de amidas sempre foi um tema central na química orgânica. Entretanto, o futuro aponta para processos cada vez mais automatizados, rápidos e sustentáveis, permitindo a criação de milhares de moléculas em menos tempo e com maior precisão.
Uma das tendências mais promissoras é a síntese em fluxo contínuo, que substitui os reatores tradicionais em batelada por sistemas onde os reagentes fluem de maneira controlada.
Vantagens:
Maior eficiência na formação de amidas.
Condições reacionais otimizadas e reprodutíveis.
Redução do tempo de produção.
Melhor escalabilidade para a indústria farmacêutica.
No caso de amidas, essa técnica já está sendo usada para acoplamento peptídico e para a produção de intermediários farmacêuticos em larga escala.
Outra revolução em curso é o uso de robôs automatizados e inteligência artificial (IA) para projetar e sintetizar novas amidas.
Robôs químicos: conseguem realizar centenas de reações de acoplamento amídico simultaneamente, testando diferentes condições de reação.
IA na síntese: softwares de modelagem preveem quais modificações em amidas podem gerar moléculas mais eficazes e resistentes.
Essa automação permite explorar bibliotecas moleculares gigantescas, acelerando a descoberta de novos fármacos.
O futuro também aponta para a substituição de reagentes tóxicos por catalisadores verdes, como enzimas e metais não nobres. Isso reduz o impacto ambiental e torna a produção de amidas mais limpa.
Catálise enzimática: uso de lipases e amidases para formar amidas em condições brandas.
Metais alternativos: catalisadores à base de ferro e cobre para acoplamentos seletivos.
Pesquisas recentes também indicam a possibilidade de impressão 3D de moléculas, onde reatores miniaturizados permitem sintetizar amidas sob demanda. Isso abre espaço para a produção personalizada de medicamentos em hospitais e laboratórios clínicos.
O futuro da química farmacêutica não depende apenas da automação, mas também da integração com a biotecnologia e com a medicina personalizada. Nesse contexto, as amidas desempenham papéis essenciais.
Toda proteína contém ligações amida (peptídicas), que conectam aminoácidos. Essa característica é explorada para criar:
Peptídeos sintéticos: usados como hormônios artificiais, vacinas e antibióticos peptídicos.
Proteínas recombinantes: como a insulina, cuja atividade depende de ligações amida estáveis.
Biológicos modernos: anticorpos monoclonais e terapias baseadas em proteínas, que usam amidas como sustentação estrutural.
A medicina personalizada busca criar tratamentos adaptados ao perfil genético e metabólico de cada paciente. As amidas entram nesse cenário por sua versatilidade estrutural.
Pró-fármacos amídicos: moléculas inativas que são ativadas no organismo do paciente, ajustando o tratamento de acordo com sua resposta metabólica.
Anticâncer personalizados: como a capecitabina, um pró-fármaco com amida que libera o agente ativo apenas em células tumorais.
Ajuste farmacocinético: modificações em amidas permitem que o medicamento tenha meia-vida, absorção e excreção adaptadas a diferentes perfis genéticos.
A biotecnologia também utiliza amidas em estratégias de entrega de genes e células modificadas. Nanopartículas contendo amidas aumentam a estabilidade e permitem o transporte seguro de DNA, RNA ou proteínas terapêuticas.
Aplicações recentes: vacinas de RNA mensageiro (mRNA) usaram nanopartículas lipídicas baseadas em amidas para estabilizar e entregar o material genético.
Futuro: terapias celulares poderão ser controladas por biomateriais amídicos, aumentando a segurança em tratamentos avançados.
Amidas também são usadas no desenvolvimento de biomarcadores sintéticos, permitindo diagnósticos mais rápidos e precisos. Essas moléculas podem se ligar seletivamente a proteínas-alvo, revelando mutações ou alterações em tecidos específicos.
O futuro da química farmacêutica aponta para medicamentos cada vez mais complexos e direcionados. As amidas serão parte central desse processo, seja em moléculas pequenas, em biológicos ou em nanomateriais terapêuticos.
A resistência antimicrobiana exige antibióticos inovadores. O desenvolvimento de amidas não naturais ou modificadas pode gerar moléculas capazes de superar os mecanismos de defesa bacterianos.
Exemplo futuro: antibióticos híbridos que combinam β-lactâmicos tradicionais com cadeias amídicas projetadas para resistir às β-lactamases.
Medicamentos anticâncer baseados em amidas poderão atuar de forma seletiva apenas em células tumorais, reduzindo efeitos colaterais.
Nanocarreadores amídicos: liberam o fármaco ativo somente no ambiente ácido dos tumores.
Amidas fotossensíveis: ativadas apenas sob luz direcionada, evitando danos a tecidos saudáveis.
As amidas já são parte de antirretrovirais como tenofovir e zidovudina. O futuro pode expandir esse papel para novas pandemias.
Pró-fármacos amídicos antivirais: ativados apenas em células infectadas, aumentando a eficácia e reduzindo toxicidade.
Amidas em vacinas: usadas como adjuvantes e estabilizadores de proteínas recombinantes.
A nanomedicina busca criar sistemas de liberação controlada de fármacos. Amidas são excelentes para compor nanocápsulas, hidrogéis e polímeros biodegradáveis, graças à sua estabilidade e capacidade de interação com biomoléculas.
Aplicações:
Liberação gradual de antibióticos em infecções crônicas.
Administração localizada de analgésicos.
Entrega controlada de anticorpos monoclonais.
As amidas são muito mais do que um simples grupo funcional na química orgânica. Elas representam uma das bases estruturais mais relevantes para a química medicinal, estando presentes em antibióticos, antivirais, anticâncer, analgésicos e em uma infinidade de medicamentos que transformaram a forma como a humanidade enfrenta doenças. Ao longo deste estudo, exploramos como esse grupo funcional se consolidou como protagonista no desenvolvimento de fármacos e como continuará a desempenhar um papel central nas inovações da farmacologia do futuro.
A trajetória das amidas na química farmacêutica mostra que esse grupo funcional não é apenas um recurso do passado, mas o alicerce do presente e do futuro da medicina. Sua presença em antibióticos, antivirais, analgésicos e anticâncer prova que elas são indispensáveis para a manutenção da saúde pública mundial.
O impacto direto das amidas pode ser medido em milhões de vidas salvas todos os anos, na redução da mortalidade infantil, no controle de epidemias e na ampliação da expectativa de vida global. Sem elas, a farmacologia moderna seria muito mais limitada e os desafios da resistência antimicrobiana seriam praticamente intransponíveis.
O futuro aponta para um cenário ainda mais promissor, onde novas técnicas de síntese automatizada, aplicações em biotecnologia e a medicina personalizada transformarão as amidas em protagonistas de uma nova era da farmacologia.
Assim, o estudo e a inovação contínua nesse grupo funcional permanecem como prioridade na pesquisa científica e na indústria farmacêutica. A função amida continuará sendo o fio condutor entre a química orgânica e a saúde pública, garantindo que a ciência avance e que a humanidade disponha de medicamentos cada vez mais eficazes, seguros e sustentáveis.
As amidas são compostos orgânicos que contêm o grupo funcional –CONH₂ (ou variações). Na química farmacêutica, elas são fundamentais porque oferecem estabilidade química, interagem de forma eficaz com proteínas e enzimas e estão presentes em muitos medicamentos essenciais, como antibióticos, antivirais, analgésicos e anticâncer.
As amidas permitem ajustes estruturais que tornam antibióticos mais eficazes contra bactérias resistentes. Modificações em cadeias amídicas podem:
Impedir que enzimas bacterianas degradem o fármaco.
Melhorar a penetração nas células bacterianas.
Ampliar o espectro de ação do antibiótico.
As novas técnicas incluem:
Síntese em fluxo contínuo, que aumenta a eficiência e a escalabilidade.
Automação e robótica, que aceleram a produção de novos compostos.
Catálise enzimática, uma alternativa sustentável e ecológica.
Uso de inteligência artificial, para prever quais modificações em amidas gerarão melhores resultados clínicos.
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